Em 06/02/2022
Por
Alex Brito
Costuma-se dizer que estamos atravessando um processo gradativo de transição energética que deverá se consolidar com a redução da participação dos combustíveis fósseis na matriz energética global, que poderá nos conduzir para uma economia de baixo carbono. A pressão para a mudança é resultado, principalmente, do entendimento, proposto pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC), organização criada pelas Nações Unidas (ONU), de que a principal causa das mudanças climáticas e do aquecimento global deve-se a esse tipo de combustível.
Assim, é cada vez maior o esforço das grandes corporações internacionais e dos Estados Nacionais na produção ou no fomento dos mais variados bens e serviços, a partir das novas tecnologias provenientes das chamadas energias renováveis. A lista de possibilidades e grande! Dos parques eólicos, que tomaram conta da paisagem litorânea, principalmente do Nordeste, às grandes usinas de módulos de geração de energia solar, apenas para ficar nestas duas. Bom, mas a questão estratégica que deve ser de interesse público é: qual o impacto dessas tecnologias sobre a criação de empregos? Há diferenças entre as distintas fontes de energias renováveis?
Para responder a essas questões, dois pesquisadores japoneses, Hiroki Hondo e Yue Moriizumi, publicaram um artigo com os resultados de uma pesquisa científica que avaliou o potencial de criação de empregos das tecnologias de geração de energia renovável. Foram analisadas as características do emprego de 9 diferentes tecnologias de geração de energia: eólica, hidrelétrica de pequena escala, biomassa (de madeira), três tipos de biogás (resíduos de animais, de alimentos e esgoto), geotérmica e dois tipos de energia solar fotovoltaica. Os resultados revelaram que existem diferenças distintas entre os impactos das nove tecnologias no emprego. Estima-se que o potencial total de criação de emprego ao longo do ciclo de vida esteja na faixa de 1,04–5,04 pessoas-ano por GWh gerado. Além disso, as nove tecnologias têm características únicas sobre quantos e quais tipos de empregos são criados ao longo de todo o ciclo de vida. Contudo, a introdução dessas tecnologias em uma economia induz direta e indiretamente empregos em diferentes setores industriais, refletindo suas características tecnológicas.
Um primeiro aspecto dessas características diz respeito à capacidade de geração de emprego ao longo de todo o ciclo de vida tecnológico dessas fontes renováveis de energia (construção, operação e manutenção). As tecnologias ligadas à geração de energia fotovoltaica (residencial e de grande escala) chegam a gerar entre 2,73 e 2,84 postos de trabalho por pessoa/ano para cada GWh de energia gerada. Por outro lado, as fontes de energia geotérmicas de grande escala e as hidrelétricas de pequeno porte geram cerca de 1,01 a 1,85 empregos por ano a cada GWh gerado. E as tecnologias de geração de energia por meio de biomassa ou biogás, geram, aproximadamente, entre 3,9 e 5,04 empregos no ciclo de vida dessas fontes de energia. O caso do biogás é particularmente interessante, dado que a produção de energia que culminará com essa proporção de empregos é decorrente, como indicado no início do texto, do tratamento de resíduos (esgoto, orgânico etc.). Portanto, são as fontes renováveis de energia ligadas às tecnologias do biogás e da biomassa as que possuem maior capacidade de geração de emprego.
Outro aspecto importante é saber se essas oportunidades se dão na fase de construção (inicial) ou de operação/manutenção (consolidação) dessas usinas de energia. Enquanto as tecnologias ligadas à geração de energia fotovoltaicas, geotérmicas e eólicas criam, em sua grande maioria, empregos na fase de construção, as ligadas às energias provenientes do biogás e biomassa criam empregos principalmente na fase de operação e manutenção. Para um exemplo rápido: enquanto as tecnologias vinculadas à energia fotovoltaica criam 77% das oportunidades de emprego na fase de construção (e apenas 23% na fase de operação e manutenção), as ligadas à biomassa geram 90% das oportunidades de trabalho na fase de operação e manutenção, e o biogás, gera de 57% a 68% do total de oportunidades de emprego nessa fase.
Portanto, são as fontes renováveis da biomassa e do biogás as que apresentam os maiores fatores de impacto na criação de emprego no ciclo de vida útil dessas tecnologias, com oportunidades de postos de trabalho muito mais elevadas que as fontes de energia ligadas às tecnologias fotovoltaica, eólica, geotérmica e hidrelétrica. São também elas as que geram os empregos de melhor qualidade, dado que as oportunidades geradas correspondem a empregos contínuos na fase de consolidação (operação e manutenção).
Esses simples recortes da ciência colocam em tela a necessidade de se prensar o desenvolvimento tecnológico a partir das opções estratégicas que impactem o emprego, a renda e a sustentabilidade. Indubitavelmente, a economia do biogás e da biomassa estão à frente. Talvez seja a hora de repensar que estratégias vamos fomentar.
Publicado originalmente no Jornal O Imparcial – Cad. Opinião, pág. 4, São Luís, sábado e domingo, 5 e 6 de fevereiro de 2022. https://banca.oimparcial.com.br/app/uploads/edicoes/2022/oimparcial-35397.orig.pdf